José Mauro Granjeiro analisa metrologia e bioimpressão na Odontologia Regenerativa

José Mauro Granjeiro
José Mauro Granjeiro em atividade no IN 2017. (Imagem: Panoptica)
Em entrevista à coluna Quarta com Rossetti, José Mauro Granjeiro debate a forma como as duas áreas podem se ajudar mutuamente.

Entre 28 de abril e 1º de maio de 2021, ocorrerá o XI Encontro da Associação Brasileira de terapia celular e gênica. Dentro desse congresso, teremos o primeiro simpósio sobre células-tronco e biomateriais na Odontologia. A programação científica do evento será diversificada, envolvendo temas atuais da terapia celular e gênica, com enfoque também nas normas legais de sua utilização. Devido à grave pandemia de Covid-19 que está afetando o mundo, o evento será realizado de forma on-line.

Nesta edição da coluna Quarta com Rossetti, aqui no VMBlog, conversamos com o Dr. José Mauro Granjeiro, especialista sênior em Metrologia e Qualidade pelo Instituto Nacional de Metrologia e Qualidade, professor associado da Universidade Federal Fluminense, doutor em Ciências pela Universidade Estadual de Campinas, pós-doutor em Biologia Celular e Molecular pelo Instituto de Química da USP, graduado em Bioquímica e Biologia Celular e Molecular, e atuante nas áreas de Biomateriais, Biologia Óssea e Bioengenharia com ênfase em Biocompatibilidade e Toxicologia de Nanomateriais.

Quarta com Rossetti – Metrologia e Bioimpressão: como estas duas áreas podem se ajudar mutuamente na Odontologia Regenerativa?

José Mauro Granjeiro A Metrologia é a ciência das medições. Lord Kelvin costumava dizer que, se não se pode medir, não se pode melhorar (adaptação livre). As impressoras 3D aplicadas a qualquer área da Medicina/Odontologia Regenerativa demandam excelente capacidade de medida, como se observa nas estratégias baseadas em tomografias e prototipagem. Sem confiança e qualidade nas medidas e no tratamento das imagens, há risco de fracasso. Outro exemplo é o fluxo digital em franco desenvolvimento na Odontologia, no qual a precisão das medidas é crucial para o sucesso do processo. Na bioimpressão, agregamos ao processo a necessidade de medidas mais confiáveis quanto ao número e à viabilidade de células a serem utilizadas para o desfecho pretendido, às dimensões dos construtos, ao controle de qualidade das células e dos materiais, e assim por diante. Temos hoje, na ISO (International Organization for Standardization) e seus respectivos espelhos na ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), diversos trabalhos em andamento visando os melhores protocolos para análises e medidas no campo da Nanotecnologia (ISO/TC 229) e Biotecnologia (ISO/TC 226). Um reflexo de melhores ferramentas analíticas é o grande número de estudos não reprodutíveis. Deve-se destacar que a falta de reprodutibilidade se deve também a diversos outros elementos que não cabe aqui destacar.

 

Quarta com Rossetti – Na Odontologia, certos tipos de gesso não “se dão bem” com certos tipos de materiais de moldagem. Você diria o mesmo em relação aos carreadores impressos tridimensionalmente e às células cultivadas em laboratório? A especificidade aqui é maior já na partida? Já existem modelos bem definidos?

José Mauro Granjeiro Absolutamente sim. É fundamental que as matrizes que carrearão as células sejam adequadas, eficientes e específicas para o uso pretendido, além de serem biocompatíveis. É importante destacar que a Medicina/Odontologia Regenerativa pode ser estruturada em, pelo menos, três abordagens: livre de materiais, livre de células e híbrida, associando células e materiais.

Este é um ponto tão importante que na RDC 338/2020 (art. 23, inciso I-g) um dos itens fundamentais para o registro de produtos de terapia avançada classe II, ou seja, aqueles submetidos à manipulação extensa, produto de engenharia tecidual e produto de terapia gênica, é o fornecimento de informações sobre suportes, matrizes e dispositivos utilizados, incluindo os testes realizados para avaliação de segurança, biocompatibilidade e durabilidade, de acordo com a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 185, de 22 de outubro de 2001 e Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) no 56, de 6 de abril de 2001.

Ainda, uma das grandes áreas de investigação é a de desenvolvimento de novos biomateriais, entre eles os oriundos da Nanotecnologia, na qual a compatibilidade biológica é avaliada. As estratégias utilizadas na bioimpressão incluem diversos materiais, como: poli-caprolactona, ácido polilático, gelatinas, colágeno, alginato, matriz extracelular acelularizada, seda, fibrina, polietilenoglicol ou combinações destes materiais. Sob o tema “bioprinting and scaffold”, no PubMed, há cinco revisões sistemáticas muito interessantes que permitem uma ótima visão geral do tema.

 

Quarta com Rossetti – Risco de contaminação dos materiais após a bioimpressão: o que já se sabe?

José Mauro Granjeiro Podemos considerar os construtos bioimpressos como tecidos do próprio corpo mantidos em um meio nutritivo e, sim, estão sujeitos à contaminação. Trata-se de um risco que deve ser considerado e mitigado. Como prevê o inciso II-c do artigo 23 da RDC 228/2020, o produto de terapia celular avançada classe II deve ser estéril. Ainda, considerando a manipulação de células in vitro, é necessário também absoluto cuidado com impurezas, efeitos imunogênicos potenciais e potencial tumorigênico do produto de terapia avançada.

Os desafios de vencer a contaminação são questões bem encaminhadas na área da Saúde, e a definição e validação de procedimentos para controle de qualidade podem mitigar o risco e proporcionar segurança ao procedimento. Por exemplo, o preparo dos construtos deve ocorrer em ambiente controlado, que inicia na cabine de segurança, e com segurança ser aplicado aos pacientes. Tendo em vista que a esterilização do produto não é factível, o controle de contaminação deve ocorrer durante todo o processo de produção.

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