Data de publicação: 05/02/2021
Uma das piores situações vividas por nós, cirurgiões-dentistas, é ter que refazer um caso feito por nós mesmos. São aquelas situações em que, notadamente, cometemos algum equívoco e temos que repetir o procedimento para “consertar” o que erramos. Estas situações pegam fundo no nosso ego e, principalmente, no nosso orgulho, pois temos que admitir o erro e tentar repará-lo. Um cirurgião plástico amigo meu, em uma conversa informal, me confessou – como já era de se esperar – que repetir casos também faz parte da vida dos médicos. Só que eles costumam chamar estas repetições de retoques.
O que ocorre é que, depois de 30 anos de formado, você vai achando que já está imune a este tipo de situação e não acredita que ainda pode errar, mesmo em situações corriqueiras do dia a dia de um consultório odontológico. Foi exatamente isto que me aconteceu agora, no início de 2021, com um caso clínico aparentemente simples que relato na coluna de hoje.
O caso em questão já se tratava de uma reposição de implantes perdidos em uma paciente que havia refeito enxertos ósseos no seio maxilar para viabilizar a colocação dos implantes. As Figuras 1 a 12 ilustram todo o caso.
O planejamento era colocar dois implantes no espaço edêntulo (24 a 26) com uma boa distância do elemento 23, que já havia sido tratado com cirurgia de implantoplastia para debelar uma peri-implantite recorrente. Vale lembrar que todas as lesões periodontais dos dentes naturais também foram tratadas e, assim como o implante 23, estavam estáveis sem recorrência de inflamação dos tecidos moles.
Quando eu examinei as radiografias, pude facilmente identificar o meu erro. Entretanto, como se eu não quisesse acreditar que teria que refazer o caso, comecei a pensar em deixar esta resolução do erro para a cirurgia de reabertura, pensando que o protesista poderia resolver o caso de alguma forma, sem que eu tivesse que remover algum dos implantes. A cegueira e o orgulho estavam querendo me dominar.
Felizmente, o protesista Dr. Henrique Tavares, muito educadamente, entrou em contato comigo e me fez enxergar que o melhor caminho seria refazer o caso o mais rápido possível, removendo o implante na região do 25 e colocando outro mais próximo da região do elemento 24. Além de me alertar sobre a dificuldade protética que teríamos, caso os implantes fossem mantidos nesta posição, ele ainda me fez ouvir que esta proximidade poderia gerar uma peri-implantite. Logo eu, com tantos artigos e um livro publicado sobre peri-implantite, tive que ouvir de um protesista que a minha cirurgia fatalmente levaria a uma peri-implantite. Foi um verdadeiro soco no queixo!
Obviamente, todos nós somos passíveis de erros. Afinal, errar é humano e só não erra quem não faz. Contudo, é sempre mais fácil criticar os erros dos outros do que assumir os nossos. Assim, o mais importante quando nos deparamos com uma situação dessas é engolir o nosso orgulho e admitir a falha, tentando resolvê-la o mais rápido possível e da maneira menos traumática e eficiente para o paciente.
“Não julguem, para que vocês não sejam julgados. Pois da mesma forma que julgarem, vocês serão julgados; e a medida que usarem também será usada para medir vocês. Por que você repara no cisco que está no olho do seu irmão e não se dá conta da viga que está em seu próprio olho? Como você pode dizer ao seu irmão: ‘deixe-me tirar o cisco do seu olho’, quando há uma viga no seu? Hipócrita, tire primeiro a viga do seu olho, e então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão. (Mateus 7:1-5)
Marco Bianchini
Professor associado II do departamento de Odontologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); autor dos livros “O Passo a Passo Cirúrgico na Implantodontia” e “Diagnóstico e Tratamento das Alterações Peri-Implantares”.
Contato: bian07@yahoo.com.br | Facebook: bianchiniodontologia | Instagram: @bianchini_odontologia