Por unanimidade, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo julgou procedente o recurso do Instituto Brånemark contra a decisão em primeira instância na ação civil pública que discute o cumprimento das obrigações relacionadas à antiga sede da entidade, localizada na Avenida Nações Unidas, em Bauru (SP). A decisão judicial foi proferida na última segunda-feira (25/04) e afastou integralmente a condenação do instituto em favor do município, em valores que hoje ultrapassariam os R$ 20 milhões.
O Tribunal de Justiça considerou que o Instituto Brånemark cumpriu todas as suas obrigações, realizando em média 285 atendimentos por mês. A lei obrigava um mínimo de 100 atendimentos neste período. Além disso, a entidade teve 80,24% de tratamentos gratuitos, enquanto a lei estipulava 80%. O instituto ainda prestava contas ao município de Bauru, que sempre as aceitou sem qualquer ressalva.
Na ocasião da ação civil pública, em 2017, o município de Bauru ingressou no polo ativo da ação. Desta forma, com a reversão da condenação, a prefeitura da cidade paulista deverá indenizar o Instituto Brånemark pelo valor integral de todas as edificações realizadas no terreno de sua propriedade. Segundo o advogado Paulo Roberto Parmegiani, este valor será calculado posteriormente, em cumprimento de sentença.
De acordo com Mauricio Cardoso, presidente do Instituto Brånemark, a vitória judicial traz sentimentos distintos. “O agradecimento é enorme por termos ganho um processo judicial que se estendeu por cinco anos. Mas, ao mesmo tempo, uma sensação de impotência, já que o Instituto foi impedido de dar continuidade ao legado social do fundador. Após a lacração do prédio, foram cinco anos de atuação de forma limitada em local adaptado, priorizando os pacientes que já haviam sido reabilitados ou em fase final de tratamento”, explica Cardoso.
Antes do imbróglio, o Instituto Brånemark contava com 14 funcionários. Após o início do embate, este número caiu para dois, já que empresas deixaram de apoiar financeiramente as ações, recursos indispensáveis em uma entidade que nunca recebeu dinheiro público para seu funcionamento. Como consequência, houve um grande prejuízo nos atendimentos. “O que mais lamentamos foi a interrupção do atendimento dos pacientes. Neste tempo parado, são aproximadamente 1.000 pacientes que deixaram de ser reabilitados. Este foi o maior dano à população carente, que não tem acesso a reabilitações implantossuportadas de altíssima complexidade. Foram cinco anos de uma briga intensa, com decisões inconsequentes em uma ação civil pública”, aponta Mauricio Cardoso.
Com atuação clínica no Instituto Brånemark desde 2006, o mestre e doutor em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial Hugo Nary Filho acredita que a justiça foi feita, mas o prejuízo é incalculável. “O nome do Instituto e do professor Brånemark, assim como todo o trabalho realizado lá, finalmente foram reconhecidos judicialmente. No entanto, o dano é irreparável. A quantidade de pacientes que ficaram sem assistência, outros que não tiveram oportunidade de iniciar tratamento, e a desestruturação completa de uma clínica que era altamente especializada. Isso não tem preço”, lamenta Hugo Nary Filho, que também é professor coordenador do curso de especialização do Instituto.
Instituto Brånemark: uma história de atendimento a pacientes carentes
O Instituto Brånemark foi inaugurado em 2005, na cidade de Bauru (SP), realizando um antigo sonho de Per-Ingvar Brånemark, considerado o “pai da Osseointegração”. A entidade internacional sem fins lucrativos foi dada como um presente aos brasileiros pelo próprio Brånemark. Desde então, a entidade realizou milhares de atendimentos odontológicos, em sua grande maioria com pacientes carentes, especialmente inválidos orais e pessoas com defeitos extraorais. A partir de 2011, o espaço foi reformado e também passou a sediar cursos de pós-graduação.
Entre agosto de 2006 e janeiro de 2018, data da desocupação do prédio, foram realizados 42.915 atendimentos pelo instituto, sendo 27.460 clínicos e 2.052 por assistente social e profissional da área de Enfermagem. A entidade também contabilizou 3.067 triagens, 1.509 radiografias periapicais, 2.074 panorâmicas, 1.683 tomografias, 894 exames radiográficos de pacientes que passaram por triagem, 684 sedações, 148 anestesias gerais, 2.525 procedimentos cirúrgicos e 266 enxertos autógenos ou com biomateriais.
Hoje, o Instituto Brånemark trabalha em uma nova unidade, idealizada em parceria com a APCD-Bauru (Associação Paulista de Cirurgiões-Dentistas). Ela contempla o setor educacional e o atendimento de novos pacientes, além daqueles já reabilitados nos últimos 12 anos pelo instituto.
Apesar da vitória, a presença do Instituto Brånemark não está garantida em Bauru. “Essa decisão não é minha. O Instituto tem uma diretoria que vai definir os próximos passos. Nós recebemos pacientes de todas as partes do País em Bauru. Temos, por exemplo, um paciente de São Paulo que vem a Bauru para uma reabilitação extraoral, com uma prótese auricular. Vale lembrar que a conclusão deste processo pode demorar anos, incluindo a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo para a restituição do valor das edificações sobre o terreno cedido pelo município de Bauru. Mas só de não haver um passivo já significa um fardo enorme a menos. Essa foi uma grande vitória”, finaliza Mauricio Cardoso.