Quando nossos pacientes partem: o que podemos fazer?

perda de pacientes
Marco Bianchini relata "certa angústia" ao arquivar prontuários, mesmo com 30 anos de experiência.
Perda de pacientes: após receber notícias dolorosas, Marco Bianchini faz uma reflexão sobre o tratamento odontológico em pacientes idosos.

Uma das constatações mais tristes que ocorre em quem tem muitos anos de consultório é o falecimento dos pacientes mais idosos. É um efeito natural da passagem do tempo, quando as pessoas vão envelhecendo – inclusive nós mesmos – e chegando na reta final desta vida. Apesar de ser um acontecimento previsível e esperado, o envelhecimento e a morte sempre causam uma sensação de tristeza, mesmo no caso de idosos e através de causas naturais. Esses momentos nos fazem refletir sobre o real sentido da vida e, especialmente, dos tratamentos que realizamos em nossos clientes.

Neste ano, estou completando 30 anos de clínica privada. Depois de tanto tempo clinicando, a notícia do óbito de alguns pacientes não deveria me surpreender tanto. Porém, confesso que a cada prontuário que eu tenho que “descartar”, anotando lá que o paciente faleceu, me traz certa angústia. Naquela última linha do prontuário, quando estou escrevendo que o cliente veio a óbito, um filme vai passando na minha cabeça, lembrando dos atendimentos e dos tratamentos que realizei naquela pessoa que nunca mais vai voltar a sentar na minha cadeira.

Leia também: Como é possível um dente custar tão caro?

Na semana passada, vivi duas vezes esta experiência dolorosa, quando ligamos para agendar os controles periodontais e peri-implantares de dois pacientes que estavam conosco há aproximadamente 15 anos. Foram duas mortes que toda a nossa equipe sentiu bastante, pois ambos eram frequentadores assíduos da nossa clínica. Um deles havia realizado dois protocolos, e o outro havia realizado alguns implantes unitários. Este paciente que havia realizado os protocolos sobre implantes tinha 92 anos e faleceu por complicações após uma cirurgia para retirada de um tumor no intestino. O outro, que havia realizado alguns implantes unitários, tinha 72 anos e sofreu um AVC (acidente vascular cerebral) fulminante.

Ao reavaliar os tratamentos que havíamos realizado nesses pacientes, eu tive uma bela sensação de dever cumprido, pois ambos puderam desfrutar por muitos anos de reabilitações implantossuportadas que melhoraram sobremaneira a qualidade de suas vidas. Contudo, isto nem sempre acontece com os nossos planejamentos e, muitas vezes, os pacientes não desfrutam deste conforto como nós gostaríamos. Isto pode ocorrer quando o óbito vem precocemente ou quando o que realizamos não se adaptou muito ao estilo de vida e aos anos que o paciente tinha pela frente.

Leia também: Dentistas do outro lado do balcão: qual imagem você transmite?

Acredito que um dos pontos que pouco se fala na Implantodontia e na Periodontia é a avaliação fria de quanto tempo de vida o paciente tem pela frente e em quais condições este paciente vai enfrentar este tempo. Somente com esta avaliação conseguiremos oferecer aos nossos clientes o que eles realmente precisam até que o derradeiro dia da morte bata na porta. Não podemos prever quando cada um de nossos clientes irá a óbito. Contudo, podemos identificar o perfil de cada um deles e selecionar o tratamento que mais se adeque às condições individuais dos pacientes.

O grande erro que ainda cometemos na Implantodontia é executar planejamentos para a colocação de implantes observando apenas a disponibilidade óssea dos pacientes. Ter muito osso disponível não significa diretamente que um protocolo fixo sobre implantes é a melhor solução. Existem outras opções que podem se adequar melhor a cada tipo de cliente, dentro de suas particularidades. Sobredentaduras, próteses fixas seccionadas (protocolos divididos) e implantes unitários podem ser a solução de acordo com o perfil e o tempo de vida que cada paciente tem pela frente. Ele pode ter muito osso disponível e levar tudo isso para o caixão dentro de poucos anos.

Leia também: Muito além dos dentes: a difícil tarefa de atender pessoas próximas

A passagem de nossos pacientes é uma dura realidade que iremos encontrar mais cedo ou mais tarde na nossa profissão. É muito triste escutar a voz das esposas ou dos filhos, do outro lado da linha, nos comunicando o falecimento dos seus entes queridos. São momentos difíceis que passamos no consultório, mas devemos estar preparados para enfrentá-los, pois, na medida em que vamos também envelhecendo, estas situações vão se tornando cada vez mais frequentes. A hora da morte vai chegar para todos nós. Ela é apenas uma fila que anda todos os dias. Logo seremos os primeiros da fila. Você está preparado?

“Se a nossa esperança em Cristo se limita apenas a esta vida, somos as pessoas mais infelizes deste mundo.” (1 Coríntios 15:19)

Translate »